24 maio 2013

Compro a sua faculdade

O grupo educacional Uniesp dobrou o número de alunos em um ano com uma estratégia agressiva de aquisições - uma média de dez por mês. Seu plano agora é chegar aos Estados Unidos

O acordo para a aquisição de outra instituição em São Paulo já havia sido acertado. Outras duas estavam em fase final de acertos. Apenas nos primeiros dez dias de maio, quatro novos estabelecimentos de nível universitário passaram a fazer parte da coleção da Uniesp. “A única vez que sentei para comprar uma faculdade e não consegui foi quando negociei com Zogbi”, afirma Costa, que hoje tem o executivo ao seu lado, atuando na linha de frente da estratégia agressiva da rede de ensino. Zogbi, à época, era dono da faculdade Casa Branca, no interior de São Paulo, e acabou fechando negócio com outra empresa do setor. Em 2012, a Uniesp mais do que dobrou seu número de alunos, alcançando 106,9 mil.

 Lição de casa: Fernando Costa e seu filho Stefano lideram a estratégia de crescimento da Uniesp, que levou à compra de 100 faculdades

 Em maio, já eram 130 mil. Costa acredita que chegará ao fim deste ano com 220 mil estudantes. Das atuais 120 faculdades do grupo, que começou a operar em Presidente Epitácio, região do Pontal do Paranapanema,no interior de São Paulo, 100 delas vieram de aquisições. “Neste ano, chegamos ao ritmo de dez compras por mês”, diz Stefano Costa, 24 anos, filho de Fernando e atual CEO da Uniesp – desde os 12 anos, ele tem uma mesa ao lado da do pai e o acompanha em visitas a Brasília e ao Ministério da Educação. A pressa para crescer já trouxe resultados para o grupo, que pretende faturar R$ 1,1 bilhão neste ano – o setor de ensino superior privado deve movimentar R$ 32 bilhões.

 O segredo da máquina de compras da Uniesp está nas condições de fragilização em que se encontra o setor educacional brasileiro. Segundo a consultoria paranaense especializada em educação Hoper, o Brasil é o País com o maior número de instituições de ensino superior com fins lucrativos do mundo. Elas, no entanto, não estão tendo lucro, em especial as de menor porte. Muitas faculdadescarregam fortes dívidas fiscais e trabalhistas. Isso criou um oceano de presas fáceis para um peixe faminto como a Uniesp. Em geral, Costa assume as dívidas fiscais e trabalhistas dos antigos proprietários. Só em alguns casos paga ao ex-dono, como aconteceu com a Faculdade Politécnica de Campinas, adquirida por R$ 17,8 milhões. “O tempo médio de compra, desde o primeiro contato, é de uma semana”, afirma Costa. 

“Não tem nada complicado em comprar escolas: a simplicidade é que cria a velocidade.” Fechado o negócio, entra em cena o hospital de gestão, uma área que fica na sede da Uniesp, no centro velho de São Paulo. Lá, as empresas adquiridas são tratadas por um time de profissionais com a missão de retirá-las da UTI e integrá-las ao grupo educacional. A primeira medida é quitar os salários atrasados e renegociar dívidas fiscais e trabalhistas. De acordo com Costa, o passivo trabalhista das escolas do grupo está zerado. As dívidas fiscais somam, atualmente, R$ 142 milhões. Além disso, a nova instituição ganha um sistema de gestão e computadores atualizados.

 A nova ambição da Uniesp, que atua em 11 Estados brasileiros (a meta é chegar a 14 neste ano), é expandir-se internacionalmente. Costa contratou o Brasilinvest, banco de negócios do empresário Mário Garnero, para intermediar a sua entrada no mercado americano. “Já há três alvos mapeados, nos Estados da Flórida e de Illinois, e eles estão conversando”, afirma Garnero. Uma parceria para pesquisas com a Rice University, do Texas, já foi acertada. A intermediação de Garnero incluiu um encontro de Costa com Jeb Bush, ex-governador da Flórida, filho e irmão de dois ex-presidentes americanos, George Bush e George W. Bush, respectivamente. O interesse da Uniesp é atrair latinos, brasileiros, em especial, que moram nos Estados Unidos, para as faculdades da empresa.

 “Muitos deles estão até em condições de marginalidade”, diz Costa. Trata-se de um foco similar ao adotado pela empresa no Brasil, que mira os integrantes das classes D e E. “Nosso projeto é pegar o último da fila”, afirma Costa. “A classe C pode ficar para a Kroton.” Para chegar a esse público, o grupo fecha parcerias com ONGs e igrejas, a fim de divulgar seus cursos. Atualmente 77% dos seus 130 mil alunos utilizam o Fies,programa governamental que financia o estudo e que facilitou o ingresso de mais gente nas faculdades privadas. A Uniesp, contudo, não se limitou a aproveitar esse contingente de novos alunos. Ela criou o programa Uniesp Paga. Trata-se de um programa voltado a atrair alunos desempregados e sem renda.

 Para ter direito ao benefício, no entanto, os candidatos precisam cumprir determinados requisitos. Entre eles, ter boas notas e fazer serviço voluntário. Se o aluno fizer a lição de casa, a Uniesp assume o financiamento contraído por ele com o Fies, ao final do curso. O Uniesp Paga já abrange 20 mil estudantes do grupo. Mas o projeto tem gerado bastante polêmica. O Ministério da Educação informou que, desde 2011, foram bloqueadas 40 instituições de ensino superior ligadas à Uniesp para receber recursos do Fies, até que sejam concluídas as investigações de denúncias de irregularidades. As reclamações vieram da Caixa Econômica Federal e de alunos que alegavam que os valores das mensalidades de quem fez o Fies seriam superiores aos dos outros estudantes.

 Alguns Procons do interior de São Paulo também registraram queixas contra a empresa. “As reclamações vieram de alunos que requisitavam mais informações sobre o Uniesp Paga, já que a propaganda induz ao erro”, diz Viviane de Cássia Sgob, diretora do Procon de Birigui, no interior de São Paulo. A direção da Uniesp se reuniu com o órgão de defesa do consumidor e se comprometeu a melhorar a comunicação. “Algumas reclamações surgem por insuficiência de esclarecimento, às vezes até por nossa responsabilidade”, diz Marco Piva, diretor de relações institucionais da Uniesp. “Estamos melhorando a comunicação sobre como funciona o programa.”

124.jpg


Por Carlos Eduardo VALIM
Fonte: istoedinheiro 24/05/2013

24 maio 2013



0 comentários: