21 março 2014

Acordo de acionistas: as cláusulas dos acordos de bloqueio

O acordo de acionistas é um negócio jurídico de direito privado, com natureza contratual, que não se confunde com o estatuto social, abrigando apenas os acionistas que dele são parte.  Os acordos de acionistas são muito utilizados em companhias, sejam elas companhias abertas ou companhias fechadas, de modo a compor os interesses de diferentes acionistas no que resguarda, basicamente, a compra e venda de ações, a preferência para adquiri-las, o exercício do direito a voto ou o poder de controle, ainda que outros temas possam ser também dele objeto.

Os acordos de acionistas podem ser classificados em dois tipos: acordos de voto e acordos de bloqueio. Os acordos de voto subdividem-se em acordos de comando e acordos de defesa. Os acordos de comando visam estabelecer uma maioria para que se possa exercer o poder de controle sobre a companhia. Os acordos de defesa, por seu turno, visam garantir à minoria a possibilidade de exercer certos direitos e impedir o livre exercício de outros direitos pela maioria. Já os acordos de bloqueio visam, objetivamente, restringir a negociabilidade das ações. É sobre eles que versa este artigo.

Dentre as mais diversas possibilidades de cláusulas para limitação da compra e venda de ações, encontramos algumas disposições já consagradas pelo mercado, notadamente o lock up (impedimento de venda de ações), o standstill period (período de salva guarda), a cláusula de venda em bloco, o direito de preferência, o tag along (direito de o acionista não alienante vender sua participação junto com acionista alienante), o drag along (direito de o acionista alienante obrigar os acionistas não alienantes a vender sua participação junto com ele), o shot gun (direito de preferência de aquisição com inversão de oferta), a call option (opção de compra), a put option (opção de venda) e a full ratchet clause (direito de não diluição).

A cláusula de lock up estabelece que durante determinado período de tempo será vedado o ingresso na companhia de qualquer terceiro ou, ainda, que será vedada a transferência de ações entre os próprios acionistas, ficando nula de pleno direito qualquer ação nesse sentido. Sem prejuízo da nulidade da transação, é comum que a penalidade pela infração desta cláusula seja a aquisição das ações do acionista infrator pelos demais acionistas pelo valor patrimonial contábil ou então a aquisição pelo acionista infrator das ações dos demais acionistas pelo valor de mercado acrescido de um prêmio.

Nessa mesma linha está a cláusula do standstill period, a qual estabelece que o acionista controlador não poderá reduzir por determinado período de tempo a sua participação acionária abaixo de um certo limite.

Já a cláusula de venda em bloco estabelece que toda e qualquer alienação, a qualquer título, deverá abranger a totalidade, e não menos que a totalidade, das ações da companhia, ou então as ações do bloco signatário do acordo de acionistas.

A cláusula de direito de preferência é muito conhecida dentre nós, especialmente em face da disposição estabelecida no artigo 171 da Lei das Sociedades por Ações, que consiste no direito de o acionista manter a participação em caso de aumento de capital (preemptive right). No entanto, existem outros dois tipos de direito de preferência, quais sejam, o right of first refusal, que nada mais é do que o direito de o acionista, aceitando as condições de oferta de compra oferecida por outro acionista, comprar as ações deste acionista em detrimento do ofertante original, e o right of first offer, que é o direito de um acionista receber a oferta de venda de ações de outro acionista, antes da oferta de venda, nas mesmas condições, para outros acionistas ou para terceiros.

O tag along consiste no direito de um acionista aderir à venda de ações de outro acionista a terceiro, pelas mesmas condições. Dentre nós já é conhecida a disposição da Lei das Sociedades por Ações (artigo 254-A), a qual estabelece que, no caso de alienação de controle de companhia aberta, o adquirente é obrigado a fazer oferta pública de aquisição de ações aos demais acionistas com direito a voto, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo igual a 80% do valor pago por ação com direito a voto, integrante do bloco de controle (esse preço pode chegar a 100% se a companhia estiver listada no Novo Mercado da BM&FBOVESPA). O tag along, claro, não se restringe apenas a esta hipótese legal, podendo os contratantes, sejam de companhias fechadas sejam de sociedades limitadas, outorgar esse direito das mais diversas formas possíveis.

O drag along, por sua vez, é o direito de um acionista (normalmente o majoritário) de obrigar os demais acionistas a aderirem à venda das ações do acionista titular do direito, nas mesmas condições. Fica claro, assim, que o direito de “grudar” (tag) é um direito dos minoritários, enquanto que o direito de “arrastar” (drag) é um direito dos controladores.

A cláusula de shot gun tem sido cada vez mais utilizada em acordos de acionistas, apresentando as mais diversas redações, possuindo os mais diversos ritos de aplicação. O shot gun pode ser definido, basicamente, como o direito de o acionista notificante exigir do acionista notificado, em determinado momento ou a qualquer tempo, a venda compulsória da totalidade das ações de sua propriedade. Após determinado prazo, o acionista notificado deverá optar entre vender a totalidade de suas ações nas condições propostas pelo acionista notificante ou então comprar a totalidade das ações do acionista notificante pelas mesmas condições por ele ofertadas, muito notadamente o preço estabelecido por ação, ficando este obrigado a vender suas ações ao acionista notificado.

A opção de compra (call option) assegura a determinado acionista o direito de, em certo momento ou a qualquer tempo, exigir a venda compulsória de parte ou da totalidade das ações de propriedade de outro acionista. As condições desta compra e venda já são estabelecidas no momento de contratação da cláusula, visando, no entanto, a evento futuro.

Por outro lado, a opção de venda (put option) é o direito de um acionista alienar sua participação acionária, em determinado momento ou a qualquer tempo, para outros acionistas. Da mesma forma que a call option, as condições já são estabelecidas no momento da sua contratação.

A full ratchet clause, por fim, obriga o controlador a compensar o acionista minoritário pela diluição injustificada de sua participação societária em novos aumentos de capital ou em venda de participação acionária pelo controlador a preço por ação mais baixo que o pago pelo minoritário no seu investimento original. Sem qualquer espécie de limitação, as cláusulas acima elencadas devem servir como balizadores e inspiração na redação de outras novas cláusulas, resguardando sempre o interesse dos acionistas e da sociedade.

Ressaltamos que não há qualquer vedação para que estas cláusulas sejam reproduzidas em um acordo de sócios no âmbito de uma sociedade limitada, o qual terá a mesma validade do acordo de acionistas previsto na lei das sociedades por ações, eis que, em se tratando de um direito disponível, reveste-se da posição de obrigações de fazer ou de não fazer e, assinado por todos os sócios, se tornará exigível seu cumprimento de pleno direito.

Portanto, o acordo de bloqueio é mais uma ferramenta para compor um adequado acordo de acionistas, que pode trazer a segurança necessária para a relação jurídica entre os acionistas e a sociedade, afastando eventuais desnecessários conflitos societários que possam prejudicar a operação. Fonte: Sillas Battastini Neves | Leia mais em zulmarneves.adv.

21 março 2014



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