30 maio 2014

Como lidar com as mudanças de governança com a entrada de um sócio

Empresas privadas em estágio inicial e/ou avançado de crescimento dificilmente encontram no mercado de crédito uma solução definitiva e satisfatória para financiar a sua expansão. O custo financeiro e a eventual ausência de um histórico de resultados, de um fluxo de caixa previsível e de garantias muitas vezes são entraves à obtenção de crédito em montantes suficientes para financiar o crescimento pretendido.


Alternativamente, a capitalização por investidores privados, tais como fundos de venture capital e private equity, já se provou uma fórmula de sucesso para empresas com esse perfil. Na perspectiva dos empreendedores, investimentos por esses fundos resultam não apenas em capital de giro e recursos para expansão, como também contribuem para a profissionalização e sofisticação de processos internos, instituição de padrões de governança corporativa, além de agregar experiência em gestão. Na ótica dos investidores, o incentivo é a possibilidade de bons retornos, alcançados por meio do crescimento e da valorização da empresa investida. 

O ingresso de investidores é quase sempre condicionado a uma ampla reforma dos padrões de governança corporativa e dos modelos de gestão da companhia investida. Além de ser uma forma de monitorar o destino dado pela companhia aos recursos investidos e a consecução do plano de negócios, também visam permitir o alinhamento de interesses com o empreendedor e facilitar novos investimentos, seja por investidores estratégicos ou até mesmo por meio da abertura de capital, dependendo do grau de sucesso do empreendimento.  

Investidores privados têm preferência pelo investimento em sociedades anônimas. É comum que um empreendimento inicialmente constituído sob a forma de sociedade limitada seja transformado em uma sociedade anônima no momento da entrada do investidor. Ao contrário das sociedades limitadas, as sociedades anônimas têm mecanismos variados e sofisticados para a captação de recursos de terceiros, tais como a possibilidade de emissão (a) de diferentes classes de ações (ordinárias ou preferenciais), que garantem a seus titulares diversos níveis de direitos, como o direito de voto ou não, a preferência na distribuição de lucros etc.; e (b) de outros tipos de valores mobiliários, como as debentures, que são títulos de dívidas conversíveis ou não em ações, e garantem a seus titulares determinados direitos que uma emissão simples de títulos de crédito não garantiria, como a participação nos lucros da companhia. 

Definindo-se o tipo societário, o empreendedor e o investidor negociarão uma reforma nos documentos constitutivos da sociedade e, na maioria das vezes, um acordo de acionistas ou de quotistas, a depender do tipo societário. 

O investidor também poderá exigir a criação de um conselho de administração, que terá um papel preponderante no aprimoramento da governança corporativa do negócio. Com a criação de um conselho, os investidores delegam a supervisão da gestão executiva a profissionais experientes, muitas vezes independentes em relação aos executivos e aos próprios acionistas. As funções normalmente delegadas ao conselho incluem a criação de diretrizes para as estratégias de negócio, o acompanhamento de sua execução, o gerenciamento de riscos e a criação de estímulos para um melhor desempenho dos executivos. É comum que os empreendedores também participem dos conselhos de administração, cumulando com a gestão executiva do próprio negócio. 

Dependendo do valor do investimento, o novo acionista poderá exigir direitos de veto para determinadas matérias. Neste caso, a gestão executiva não poderá praticar determinados atos sem o consentimento do novo acionista, em assembleia geral, ou dos conselheiros por ele nomeados, em reuniões do conselho de administração. Exemplos de matérias objeto de veto são (a) a contratação de empréstimos acima de determinados limites; (b) o desembolso de valores acima de determinados limites; (c) a assunção de obrigações acima de determinados limites; (d) a emissão de valores mobiliários ou mudanças nos direitos de valores mobiliários já emitidos; e (e) a distribuição de lucros.

Vale notar que os critérios para a prospecção de bons investimentos em negócios em estágio inicial ou em fase de crescimento acelerado nem sempre estão limitados ao potencial de sucesso do empreendimento em si, mas também levam em conta a visão e as qualidades individuais do empreendedor. Por isso, mantê-lo à frente do negócio a médio ou longo prazo é quase sempre uma condição para a parceria. Neste contexto, é comum que investidores exijam a permanência do empreendedor como acionista durante o período de maturação do negócio, estabelecendo no acordo de acionistas um mecanismo de “lock-up” (proibição de venda de ações) por determinado período ou condicionado a um evento liquidez, como a venda da totalidade das ações da companhia ou de seus ativos a terceiros, ou uma oferta pública inicial de ações. Também é comum criar mecanismos que estimulam a retenção e o desempenho dos empreendedores e executivos-chave, tais como planos de opção de compra de ações atrelando os rendimentos individuais ao sucesso da companhia.  

Em resumo, a entrada de novo investidor será quase sempre acompanhada de mudanças na governança corporativa e nos controles internos do empreendimento. Essas mudanças variarão de acordo com o valor do investimento, o grau de maturação do negócio e o perfil do investidor. Certo é que as mudanças, em geral, tendem a trazer mais transparência à condução dos negócios e facilitar novos investimentos, beneficiando a todos os participantes do empreendimento, desde acionistas a executivos e funcionários. Apesar de abrir mão da autonomia para decidir sozinho sobre a condução do seu negócio, o empreendedor na grande maioria das vezes ganha um parceiro que o irá auxiliar a enfrentar os desafios envolvidos nos estágios de desenvolvimento da empresa.  Por: Carlos Alexandre Lobo e Guilherme Ohanian Monteiro Leia mais em ABVCAP 28/05/2014

30 maio 2014



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